
Ana Bolena (c. 1500-1536) é a mais famosa das seis esposas do Rei Henrique VIII de Inglaterra (1491-1547). Durante seu reinado de três anos a rainha deu à luz uma criança do sexo feminino e sofreu cerca de três abortos. Tais eventos mudaram o rumo da história inglesa, mas o que causou tais perdas?
Ninguém sabe com exatidão quando e onde Henrique VIII de Inglaterra notou Ana Bolena pela primeira vez. Apesar de ter desempenhado um papel importante na história inglesa, temos poucos dados concretos sobre primeiros anos de Ana.
Se especula que ela tenha nascido entre 1500 ou 1501, provavelmente em Blickling. Sabemos que ela era filha de Thomas Bolena (c. 1477-1539), 1.º Conde de Wiltshire e sua esposa Elizabeth Howard (C. 1480-1538), Condessa de Wiltshire. Ana passou sua parte de infância na Inglaterra, mas ainda muito jovem foi enviada para a corte da Arquiduquesa Margarida de Áustria (1480-1530), Duquesa de Saboia.
Logo depois Ana passou a fazer parte da corte francesa como dama de companhia de Maria Tudor (1496-1533), esposa do Rei Luís XII de França (1462-1515), que faleceu pouco tempo após o casamento. Tanto a rainha francesa quanto a irmã de Ana, Maria Bolena (c. 1499-1543), voltaram para a Inglaterra, porém Ana permaneceu na Europa.
Quando Ana finalmente retornou ao seu país natal em 1521 ela era uma perfeita dama da alta sociedade, falava francês fluentemente, recitava poesia, seus vestidos eram elegantes e era dona de um charme irresistível. Sabemos que no início Henrique VIII tentou persuadir a jovem a se tornar sua amante, mas não teve êxito. Eventualmente a ideia de casamento surgiu.
Corria o ano de 1527 quando rei começou a tomar as primeiras medidas para se divorciar de sua esposa espanhola Catarina de Aragão (1485-1536). O processo durou sete anos. Durante esse período Ana ascendeu na corte e no início de 1533 foi anunciada a sua primeira gravidez. Preocupado com questionamentos acerca da legitimidade da criança Henrique decidiu tomar uma atitude radical. Fez com que o clero inglês declara-se o seu casamento com Catarina de Aragão inválido e rompeu relações com o Vaticano, se alinhando com os reformistas.
Após ser coroada rainha da Inglaterra, na Abadia de Westminster, em 26 de agosto de 1533, Ana Bolena entrou em confinamento no Palácio de Greenwich. Tratava-se de um antigo costume inglês previsto no The Royal Book, um manual de etiqueta da Corte Tudor. O confinamento tinha o objetivo de resguardar a rainha de grandes emoções. Duas semanas depois em 7 de setembro, Ana Bolena deu à luz uma menina. Ela foi batizada como Elizabeth (1533-1603). Conta-se que o parto foi rápido e fácil.
Apesar da criança ser forte e saudável obviamente o sexo do bebê decepcionou a todos, que esperavam o nascimento de um filho varão. Diante do fracasso inicial ficou claro que Ana teria que voltar a engravidar o mais rápido possível.
Em 1534 a rainha estava grávida de novo. Até mesmo uma reunião entre Henrique VIII e o Rei Francisco I de França (1494-1547), em julho daquele ano, foi cancelada devido ao estágio avançado de gravidez da rainha inglesa que impossibilitava uma travessia pelo mar. No entanto, a gestação foi interrompida por um aborto, embora alguns historiadores afirmem que tenha sido uma gravidez fantasma fruto da pressão psicológica que Ana sofria naquela época.
De acordo com o historiador Hester W. Chapman (1899-1979) Ana Bolena teve duas gravidezes no ano de 1534. Tais gestações também terminaram em abortos. Já outros autores escrevem que Ana teve mais dois abortos: um em 1535 e outro em 1536. De qualquer maneira, Ana havia falhando pela segunda vez. A rainha agora sabia que era imperativo que ela produzisse um herdeiro homem para manter sua posição como rainha consorte.
Apesar de não demonstrar suas angustias em público Henrique VIII, em privado, começou a ter dúvidas sobre a capacidade de reprodução de sua segunda esposa. Outro fator agravante era o fato dele já contar com 44 anos de idade e não tinha mais tempo a perder. A partir de então o rei começou a deixar a esposa de lado. Amantes começaram a surgir, indicando uma crise no casamento real. Os desentendimentos entre os dois se tornaram constantes e todos na corte notavam o clima tenso entre o casal.
O ano de 1536 foi derradeiro para Ana Bolena. Segundo uma carta do embaixador Eustace Chapuys (c. 1490/92-1556), que estava serviço de Carlos V (1500-1558), Sacro Imperador, em 10 de fevereiro deste ano, no dia do funeral de Catarina de Aragão, Ana havia abortado uma criança. Ainda de acordo com Chapuys a rainha estava com menos de três meses e meio de gestação. Henrique reagiu da pior maneira possível. Segundo os rumores que circulavam na corte o rei “não disse nada a ela, exceto que ele viu claramente que Deus não queria dar a ele filhos do sexo masculino”.
Após esse aborto Ana caiu em desgraça. Foi presa em maio e sob a acusação de incesto, traição e adultério foi decapitada na Torre de Londres. Mas com todo esse cenário em mente você deve estar se perguntando: o que causou tantos abortos numa mulher jovem e aparentemente saudável?
Várias são as teorias que tentam explicar o motivo dos abortos. Na primeira teoria alguns historiadores apontam para a possibilidade de Henrique VIII padecer de sífilis, doença sexualmente transmissível altamente contagiosa naquele período, cuja cura ou tratamento adequado não existiam. Para corroborar essa teoria os pesquisadores apontam duas características físicas em Henrique; em primeiro lugar o seu nariz deformado durante seus últimos anos de vida e em segundo indicam que a sua tirania era um sintoma de um ataque sifilítico ao cérebro.
Porém, muitos afirmam que essa teoria é inválida pelo fato de não haver registros de Henrique ou Ana tomando mercúrio, substância usada para tratar a doença na época. Ademais, as filhas do rei Maria Tudor (1516-1558) e Elizbeth Tudor nunca tiveram sinais da doença.
A segunda teoria tem mais adeptos e está ligada a alimentação, que carecia de vitaminas. No século XVI os vegetais eram vistos como comida camponesa e as frutas eram caras demais para comer durante o inverno. Sendo assim a nobreza basicamente se alimentava de pão e carne. Considerando isso é possível que os abortos podem ter sido causados por deficiências nutricionais, especialmente deficiência de vitamina C. Ana teria sido vítima de sua própria dieta.
A terceira teoria está liga ao sangue do casal. Ana Bolena seria RH negativo e Henrique VIII seria RH positivo. Juntos esses dois tipos sanguíneos faz com que os anticorpos da mãe ataquem o feto, causando abortos, porém a resposta auto-imune não ocorre até a segunda gravidez, o que explicaria o nascimento êxito de Elizabeth I, porém os seus irmãos não tiveram a mesma sorte.
Fontes:
FRASER, Antonia. As Seis Mulheres de Henrique VIII. Tradução de Luiz Carlos do Nascimento E Silva. 2ª ed. Rio de Janeiro: BestBolso, 2010.
RIDGWAY, Claire. The Pregnancies of Anne Boleyn. Disponível em: <https://onthetudortrail.com/Blog/anne-boleyn/guest-articles/the-pregnancies-of-anne-boleyn/>. Acesso em: 13 abr. 2019.
BECCIA, Carlyn. Anne Boleyn and this boy baby business. Disponível em: <http://blog.raucousroyals.com/2008/05/anne-boleyn-and-this-boy-baby-business.html>. Acesso em: 14 abr. 2019.
RIVERA, Mercy. Queen Anne Boleyn: Pregnancies And Motherhood; Part II. Disponível em: <https://queenanneboleyn.com/2012/03/02/queen-anne-boleyn-pregnancies-and-motherhood-part-ii/>. Acesso em: 15 abr. 2019.
Ana Bolena é uma figura emblemática na história. Parabéns Fernanda Flores por mais essa matéria.
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Olá, obrigada pelo comentário George.
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Excelente texto. Não tenta qualificar a pessoa retratada historicamente como boazinha ou ruinzinha. Apenas relata os fatos. Parabéns.
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Olá Arthur, obrigada por reparar na imparcialidade. Abraços.
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Artigo fantástico. Nunca li algo tão completo sobre esses fatos. Adorei!
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Obrigada pelo comentário Letícia. O artigo deu muito trabalho para fazer, mas o feedback do público está sendo maravilhoso. Beijos.
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Quero parabenizar a Fernanda Flores pelo blog e em especial por esse artigo maravilhoso sobre a esposa de Henrique VIII. Excelente texto.
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Olá César, fico feliz que tenha gostado da matéria. Abraços.
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Toda vez que leio seus textos eu me embriago, muito bom! Seu texto nos prende, fico sempre louco para saber qual será o próximo assunto a ser escrito por você!
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Obrigada amigo. Fico muito lisonjeada ao ler as suas palavras. Abraços.
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